por Roberto Giannetti da Fonseca
Em um país com as dimensões do Brasil, uma rede de logística eficiente é de fundamental importância para o bem-estar da população, para a competitividade do setor produtivo nacional, assim como, para sua a integração e a sua inserção internacional.
Desde a década de 50 teve início um processo intensivo de construção e de pavimentação das rodovias estaduais e federais, que prosseguiu nas décadas de 1960 e 1970. Ocorre que, com a crise fiscal do setor público brasileiro a partir dos anos 80, temos assistido mais de três décadas de subinvestimentos tanto na necessária expansão da malha rodoviária nacional como na sua própria manutenção, gerando uma crescente precarização da rede viária, elevando custos do transporte rodoviário e do número de acidentes nas estradas brasileiras.
O processo de privatização das rodovias brasileiras teve início na primeira metade dos anos 90, motivado não somente por aspectos ideológicos, mas principalmente pelo contexto de restrição fiscal vivido pelo país naquela época, o que dificultava o financiamento do investimento público. Com a estabilização do Plano Real, o fim do imposto inflacionário e o aumento dos encargos de proteção social impostos pela Constituição de 1988, a fragilidade fiscal do Estado tornou-se evidente. Os fundos que haviam sido constituídos para financiar a infraestrutura ou foram abolidos pela Constituição ou apropriados pelo imperativo de financiar o Estado. O setor público brasileiro, que havia sido o grande agente dos investimentos que possibilitaram a expansão da rede rodoviária, não seria mais capaz de exercer essa função.
Em uma análise crítica objetiva, percebe-se com clareza vantagens e desvantagens no processo de privatização das rodovias. Por um lado, esse procedimento resulta em maiores gastos para os motoristas, que precisam arcar com os pedágios. Por outro, diante da melhor conservação das estradas, se reduz substancialmente os custos de manutenção dos veículos, o tempo dos transportes de origem ao destino, e os acidentes rodoviários. E ainda mais, permite ao Estado a concentrar sua administração em funções básicas, como educação, saúde, segurança, saneamento básico, ciência e tecnologia e justiça, deixando exclusivamente por conta dos concessionários os investimentos em melhorias para as pistas, visto que a empresa que adquiriu o bem deve deixá-las em um padrão mais elevado que o anterior.
Existe ainda uma grande discussão em relação aos conceitos de privatização e de concessão, principalmente por críticos deste processo. Privatização no sentido estritamente literal significa a venda ou alienação, transferência de posse e domínio, de bens públicos de empresas estatais para o setor privado. Já o regime de concessão não se trata de uma venda, mas sim, de uma administração por tempo determinado de bens públicos pelo setor privado, com contratos de melhorias e cobrança de impostos por parte da empresa, sempre regulados pelo governo.
A grande polêmica neste ponto decorre do fato de que a lei que criou o programa de privatizações ao ter definido o processo de concessão de um bem público como uma modalidade alternativa de privatização, quando de fato, do ponto de vista estritamente técnico e jurídico são coisas bem distintas.
A experiência recente de concessões de rodovias tem tido resultados satisfatórios, especialmente no estado de São Paulo, mas a nível federal não pode ser considerada como uma experiência bem-sucedida. Dos oito trechos concedidos na última etapa do Programa Federal, um foi cassado e os demais enfrentam processos de ajustes que podem resultar em sua caducidade ou devolução. Outros empreendimentos concedidos em etapas anteriores também apresentam problemas e podem ser devolvidos, aumentando o grau de insegurança jurídica associada às concessões. No âmbito do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) não foram realizados progressos significativos.
Os problemas enfrentados pelos atuais concessionários de rodovias federais são diversos: riscos da demanda integralmente assumidos pelo concessionário, lances agressivos e modicidade tarifária sustentados por financiamento subsidiado, planos de investimento irrealistas, entre outros fatores. Torna-se imprescindível neste momento de grave crise fiscal e reforma do Estado brasileiro, repensar e aperfeiçoar o Programa Federal de Concessões Rodoviárias.
Os modelos adotados em alguns estados brasileiros e em outros países apresentam lições relevantes para a redução do grau de incerteza regulatória e melhorias nos procedimentos dos certames licitatórios. Se tomarmos como referência a recente experiência acumulada, tanto no país quanto no exterior, será possível identificar uma série de recomendações objetivas visando aumentar a quantidade e a qualidade das concessões rodoviárias no país.
O desafio para o Brasil será de, pelo menos, dobrar a taxa de crescimento do PIB nos próximos anos e para isto contribuirão decisivamente os investimentos em infraestrutura pelo setor privado. Para tanto, não se poderá repetir erros de política que reduzam o potencial de expansão e a competitividade da economia brasileira.
* Roberto Giannetti da Fonseca, economista e empresário, presidente do Conselho Gestor da Secretaria de Logística e Transportes do Estado de São Paulo e presidente da Kaduna Consultoria.
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