Não é surpresa para o transportador que está cada dia mais difícil encontrar motoristas qualificados à disposição no mercado. Essa escassez de mão-de-obra já é comentada há vários anos, e gradativamente as empresas sentem as dificuldades na contratação e retenção de bons profissionais nesta categoria. Há dois pontos principais que tornam este profissional mais requisitado que outros no mercado: o alto nível de qualificação exigido e o interesse cada vez menor na profissão.
Diferente de outros departamentos, o motorista de caminhão não pode migrar de um ramo para outro. Por exemplo, um auxiliar administrativo consegue se adaptar em uma empresa do TRC oriundo de uma empresa de comércio, sem maiores prejuízos ou dificuldades de adaptação; agora, um motorista de aplicativo que queira dirigir um caminhão precisará passar por todo processo de habilitação, treinamento e certificação, além de obter uma experiência mínima antes de ser contratado por uma empresa.
Essa dificuldade e o processo lento e oneroso para a qualificação espanta novos profissionais, como aponta a pesquisa “A Falta de Motoristas na base do SETCESP” divulgada recentemente pelo IPTC.
No Brasil, a oferta de motoristas habilitados com a categoria “C” ou similar caiu -18,97% desde 2015, uma perda de mais de 1 milhão de motoristas que deixaram de renovar suas habilitações, tiveram suas habilitações suspensas ou faleceram.
Já no estado de São Paulo, a queda é ainda maior: -27,95%, em comparação com cinco anos atrás, ou seja, uma queda de quase -9% ao ano.
Pode ser atribuído à essa diminuição a recessão econômica do País no período, mas grande parte se deve às mudanças nas regulamentações para obtenção da CNH (Carteira Nacional de Habilitação) que tem exigido um esforço maior por parte do motorista para a obtenção do documento, e também a obrigatoriedade de exames como o toxicológico, implementados recentemente neste período. O grande número de multas que é acumula no registro profissional do motorista também é um fator muito negativo para a profissão.
O resultado deste fenômeno já é bem claro e conhecido por todas empresas: a alta rotatividade. E a pesquisa conseguiu ilustrar isso de maneira muito clara: há um pico de contratações e demissões de motoristas todo ano, que ocorre no mês de outubro, sem exceções. Neste mês, a movimentação de empregos chega a ser 3 vezes maior que a média mensal, tanto nas admissões quanto nos desligamentos, possivelmente motivada pelo aumento de demanda do final de ano.
E, quando analisado o motivo de desligamento, observa-que a maior parte provém do próprio motorista, que ao receber uma oferta em outra empresa pede o desligamento imediato da empresa atual. Neste processo, a empresa desfalcada busca outro profissional no mercado, e por ser um mercado muito acirrado, acaba contratando um motorista que possuía vínculo com outra empresa – e assim a rotatividade só cresce. Os dados de desligamento mostram também que os motoristas ficam em média 1,94 anos na empresa antes do desligamento. Imagine renovar todos os motoristas de uma empresa a cada dois anos?
Isso nos leva a um ponto fundamental, que são os custos desta rotatividade. Além dos custos demissionários e de contratação de profissionais, o novo colaborador apenas entregará a total produtividade após um período de treinamento, integração, além de correr o risco de haver caminhões parados nesse meio tempo.
Uma estimativa da nossa pesquisa revelou que o custo para as empresas chegou na ordem de R$18,7 milhões para o ano de 2019, que podem ser atribuídos à falta de motoristas no mercado nos municípios que compõe a base territorial do SETCESP. Esse custo está mais concentrado nas empresas de médio porte (classificadas como possuindo entre 20 a 250 funcionários na pesquisa), pois são onde a maior rotatividade está acontecendo.
Nas empresas pequenas, que são a maioria, a rotatividade é baixa dado que muitas vezes os motoristas são os próprios empresários ou membros próximos da família; já nas empresas grandes, a existência de planos de carreira e programas de retenção faz com que poucos motoristas queiram deixar seus postos para outras oportunidades.
A escassez de motoristas é um assunto global, discutido em todos os países, pois cada vez menos jovens querem seguir esta profissão. De fato, em 2010 a maioria dos habilitados com a categoria “C” ou similar estavam na faixa dos 40-50 anos; hoje, em 2020, temos menos da metade de pessoas habilitadas nesta faixa etária do que 10 anos atrás, e a maioria dos motoristas já está na faixa dos 50-60 anos.
Além disso, as faixas de idade menor que 30 anos possuem um número irrisório de motoristas. Como será daqui a 10 anos, quando a grande massa de motoristas estiver entrando na casa dos 60-70 anos? Onde buscaremos novos profissionais?
Em São Paulo, a idade média de contratação do motorista de caminhão pelas empresas do TRC subiu de 38,37 anos para 41,68 anos nos últimos anos, e está subindo a um ritmo cada vez mais acentuado.
Sendo assim, as empresas de transporte rodoviário de cargas precisam estruturar programas de retenção para estes profissionais e apostar em programas de carreira para novos motoristas, para que não ocorra um colapso no futuro e o Brasil precise buscar motoristas de outras regiões e países – fenômeno que já está acontecendo em muitos lugares.
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